PCC surge do mata-mata em SP e tenta criar hegemonia no crime

17/10/2012 16:20

 

Enquanto o crime no Rio era tocado por facções desde 1980, só no fim dos 1990 uma organização marcou presença em SP
A mística em torno das facções no Rio de Janeiro começou em 1981, quando Zé Bigode, cofundador do Comando Vermelho, refugiou-se no Conjunto dos Bancários, na Ilha do Governador, trocando tiros com 400 policiais por 10 horas até ser morto.
Com um bom fornecedor de cocaína, entre 1983 e 1986 o Comando dominou as bocas de fumo tradicionais, tocadas por pequenos traficantes de maconha. Em 1985, já detinha 70% dos pontos de venda em um grande e lucrativo mercado.
Em São Paulo, desde os anos 1970, quando as taxas de crime começaram a crescer, pequenas células isoladas de criminosos se equilibravam parcamente, correndo o risco de serem caçadas por justiceiros, policiais e criminoso rivais.
O roubo sempre foi o negócio principal. O tráfico de drogas só se fortaleceria em São Paulo depois dos anos 1990, com a chegada do crack.
Entre 1981 e 1996, o roubo em São Paulo cresceu em média 9% ao ano. Enquanto no Rio os criminosos se vinculavam a facções que dominavam territórios nos morros, em São Paulo os integrantes do mundo do crime se relacionavam de igual para igual, como indivíduos, pisando em ovos e disputando poder em territórios conflagrados, onde viviam sob risco de matar ou morrer a qualquer momento.
Nessa estrutura criminal sem hierarquia, horizontal, sobravam oportunidades e motivos para vinganças e assassinatos banais. "Ninguém é melhor do que ninguém" sempre foi uma frase repetida nesse cenário igualitário e instável das redes criminais paulistas. Na prática, jovens desconfiavam de outros jovens, vistos como homicidas em potencial, e matavam motivados às vezes por conflitos banais.
Origem. É nesse contexto de mata-mata e desordem que o Primeiro Comando da Capital começou a se formar nas prisões em 1993. E a se fortalecer, com discurso que propunha fim das mortes de integrantes do crime e incentivo a negócios ilegais.
 
Chacina e crack revelam ápice da desordem nos anos 1990
 
Em 1998, 12 pessoas foram mortas em um bar em Francisco Morato
No começo dos 1990, o crack - droga feita a partir da pasta de cocaína com bicarbonato de sódio e vendida em pequenas pedras que tornavam a dose barata - aumentou o giro das bocas e a quantidade das biqueiras nas periferias de São Paulo. Viciados em crack, chamados de noias, mergulharam de cabeça no consumo, fazendo de tudo por novas doses. Eles se tornaram um dos alvos preferenciais dos matadores. "Noia se mata com pedrada, não precisa nem gastar balas de tão tranqueira", dizia César Souza em 1999, matador do Grajaú.
As chacinas - casos em que três ou mais vítimas são assassinadas - alcançaram 95 casos anuais em 2000. E eram o retrato da desordem generalizada. Na maior ocorrência do Estado, em 1998, 12 pessoas foram mortas em Francisco Morato. Os autores, PMs que também faziam segurança, buscavam uma menina que testemunharia contra eles na Justiça. Mataram os outros para evitar o risco de sobrarem mais testemunhas.
"É aquela coisa. Está de madrugada, bebendo com quem não presta, coisa boa não deve ser", explicava José Idelvan dos Santos sobre as três chacinas que praticou nos anos 1990.
Nesse contexto de extermínio, as periferias passaram a expurgar os consumidores para o centro de São Paulo. A cracolândia se tornaria uma zona neutra, um refúgio onde se podia traficar sob os olhos da polícia e consumir a droga sem o risco de ser assassinado.
Nas periferias, com revólveres e medo em excesso, conflitos banais podiam provocar escolhas homicidas. O aluno de uma escola em Diadema explicou o assassinato praticado por um amigo. Ele ia toda manhã levar a irmã à aula e um jovem o encarava do lado de fora da escola. No terceiro dia, atirou e matou o jovem sem questionar. "Está certo. Desacreditou, tem de morrer."(O Estado de S.Paulo)