UMA GUERRA QUE JÁ PERDEMOS. TODOS NÓS.

22/10/2015 18:17

AS POLÍCIAS DE SÃO PAULO ESTÃO NOVAMENTE EM GUERRA, APÓS UMA TRÉGUA DE SEIS ANOS. QUEM PERDE COM ISSO É A SOCIEDADE.


PATRULHEIRO, NÃO ENTRE NESSA GUERRA. ELA NÃO É SUA. QUALQUER QUE SEJA O RESULTADO, NÓS PERDEMOS.


DESDE 2008, APÓS O CONFRONTO nas proximidades do palácio do governo, na capital paulista, onde a Polícia Civil participava de uma manifestação salarial e caminhava em direção à sede do governo e foi obstada pela PM, o que acabou em um confronto entre as instituições, o qual refletiu diretamente nos patrulheiros, que lidavam diretamente com a polícia civil nas delegacias a cada ocorrência que conduziam até os distritos policiais.


Nós patrulheiros sentimos na pele o impacto dessa animosidade entre as instituições. Muitos foram obstados, constrangidos e até humilhados nas delegacias, por delegados e escrivães que tomaram as dores daqueles manifestantes.
 

Esse desconforto durou quase um ano, sendo dirimido aos poucos, pela persistência dos PATRULHEIROS, que de fato, CARREGAM AMBAS AS POLÍCIAS NAS COSTAS, sem falsa modéstia. Se o patrulheiro parar, o Estado vai à falência em menos de uma semana.
Agora, após seis anos de relativa paz, a guerra voltou. Só que desta vez, disfarçada de IDEOLOGIA DE TRABALHO CORPORATIVO. Os coronéis, ao escolherem o lado do governo em 2008, conquistaram a simpatia do governador e foram contemplados com inúmeros benefícios, cargos comissionados, diretorias de estatais, chegaram a comandar 30 das 31 sub-prefeituras da capital, receberam gordos aumentos e conquistaram posicionamento político de destaque, inclusive com verba pública para elegerem seus representantes, através da “associações” de policiais, verdadeiras máquinas de lavar dinheiro.
 

Em contrapartida, os delegados, que se mostraram rebeldes, foram rechaçados e passaram a perder cargos de confiança e comissionados, sendo relegados a um segundo plano, perdendo status e credibilidade.


Observem que em momento algum falo dos operários de ambas as polícias, porque eles não estão incluídos no contexto social da demanda. São peões. Movidos por seus gestores para “limpar o caminho” até o adversário.


Naquela passeata, a primeira linha de “combate” aos policiais civis, era composta por patrulheiros. Gente comum que trabalha de polícia e que, com conhecimento de causa, mas sem poder desobedecer aos seus “superiores”, montaram a primeira linha de contenção. Eles sabiam que a manifestação era legítima e que, se exitosa, seriam também beneficiados afinal, desde 1993 havia isonomia de salários através da lei complementar 731/93. O que a policia civil conseguisse, refletiria nos vencimentos da própria PM também. Isso é muito elementar.


A Polícia Civil não teve a menos dificuldade de romper esse obstáculo feito pelos patrulheiros que, acima de tudo, respeitaram a incolumidade física dos policiais civis. Isso despertou medo no governador que prometeu mundos e fundos para os coronéis se os policiais civis fossem impedidos de se aproximarem dele.


Aí começou o perigo.

A TROPA DE CHOQUE estava posicionada. São homens com treinamento diferenciado. Doutrinados. Vivem aquartelados, sem contato com o público. Vivem por um ideal militar. Não são socializados. São guerreiros. Os melhores que se pode conseguir, tanto em lealdade quanto em dedicação. Seu lema é:

“NO VÃO DO ESCUDO NÃO PASSA NINGUÉM”.
E não passou mesmo.

O governador teve ali a certeza que tinha escolhido a corporação certa para defender seu “campo santo”. Contabilizou o prejuízo e viu que era suportável.
 

O Brasil inteiro viu a PM baixando a lenha na Polícia Civil e o crime organizado comemorou como nunca. Ali começava a falência da segurança pública no estado de são Paulo.
 

Desde então os coronéis vem se organizando para assumir de vez o lugar dos delegados, mas com uma agravante: Não incluíram os praças em seus planos.
 

Isso mesmo. Não há lugar para praças no plano de poder dos coronéis.
Sua estratégia foi perfeita.

Aos poucos foram se aproximando do governador e sorrateiramente foram assumindo funções de outras secretarias, de outras instituições, de outras autarquias e sobrecarregando o operário na ponta da linha com escoltas de presos (função da secretaria de assuntos penitenciários), guarda de cadeias (função da polícia civil), guarda de fóruns, da ALESP, Palácio, câmaras, prédios públicos, bibliotecas, escoltas de valores, praças de padágios, segurança de empresas e empresários e mais uma série de serviços que se desviam da função constitucional da Polícia Militar, tudo para agradar ao governador, que não precisava mais gerenciar sua baixa competência, uma vez que a PM abraçava o problema e exigia cada vez mais do operário.


Com o passar dos anos, a Polícia Civil foi engessada e a PM, à custa do trabalho da linha de produção, foi galgando degraus valiosos do ponto de vista político, a ponto de fazer crer aos praças, 80% do efetivo, que os coronéis lutavam pela categoria, e não pela oligarquia, elegendo vários oficiais superiores para representarem os ideais de segregação da macro empresa Polícia Militar do estado de são Paulo.


Até pouco mais de um mês atrás, a PMESP dominava a cultura do resto do país com a idéia de usurpar as funções da Polícia Civil por completo, sacrificando seu operário e conseguindo poder absoluto sobre a persecução criminal, não só no estado, mas no país inteiro.
Por que estou dizendo “usurpar” se represento justamente os funcionários da PM? Não deveria defender seus ideais?
 

A APPMARESP defende o cidadão policial militar PRAÇA. Não defende a PMESP e nem sua segregação sobre o PRAÇA. Somos contrários à forma de exploração, que segrega, que humilha, separa, pune sem direito a defesa, rouba a dignidade e reprime o pensamento.
 

As alegações dos coronéis para usurpar o inquérito, a investigação e a polícia cartorária, são de que o policial perde tempo nas delegacias, que os delgados soltam os bandidos presos pela PM, que fazem meio policiamento, que começam e não terminam, que a polícia civil não tem condições de fazer o seu trabalho, entre outras.
 

Se de fato essas são as falhas, não são de caráter funcional, mas sim estrutural. Se o policial perde tempo nas delegacias, é só colocar em prática a resolução nº SSP-57/2015.
 

Se os delegados soltam os bandidos presos pela PM, caso isso seja ilegal, e não uma garantia do preso, é só DENUNCIAR OS DELEGADOS QUE FAZEM ISSO, sem virar guerra. Nos termos da lei, através de denúncia formal à corregedoria e ouvidoria da polícia. Não precisa ir um monte de oficiais na porta de uma delegacia gritar e xingar porque isso só piora a situação do pracinha que está sendo frito lá dentro. Acabado o circo os coronéis vão pros seus condomínios de luxo dormir um sono tranquilo e o praça vai pro Romão, como aconteceu.


Se a PM faz meio policiamento, e DISSO DISCORDO VEEMENTEMENTE, uma vez que fazemos não só o nosso como o da POLÍCIA CIVIL, o da SAP, o da CET, o das GCMs, POLICIAMENTO PARTICULAR, ATENDIMENTO SOCIAL, do SUS, etc, através do 190, que funciona como UMA CENTRAL DA POLÍCIA CIVIL, uma vez que atende ilícitos que “JÁ OCORRERAM”, o que por determinação constitucional, é dever da PC e não da PM.

Essa determinação para fazer o trabalho de todo mundo é requerida pelos PRÓPRIOS CORONÉIS, a fim de acumularem poder. Se querem que a PM faça o seu trabalho completo, podem começar por devolver as atribuições da Secretaria de assuntos Penitenciários, devolvendo a guarda e escolta de presos. Podem devolver o trabalho das empresas de vigilância, retirando milhares de policiais militares das guardas de fóruns, da Assembleia Legislativa, casa Militar, Casa civil, Escolta de autoridades, Palácio do Governo, Praças de pedágios e mais uma série de “usurpações” legitimadas por convênios escusos que sobrecarregam os praças na ponta da linha.


A PM COMEÇA E TERMINA SIM. Ela começa e termina o policiamento preventivo, sua função constitucional. Não tem que levar o preso até o juiz porque não é sua competência. Sua competência é ser vista pelo cidadão e evitar o cometimento de crimes e, caso se depare com o crime ocorrendo, cuidar para que cesse. A partir daí já não é mais sua competência, portanto a PM faz o trabalho completo sim.
Se a polícia Civil não tem meios materiais de fazer o seu trabalho, o mesmo ocorre com a PM. Não é retirando as funções de uma E DANDO PRA OUTRA que se resolverá o problema.
Se a PC tem uma baixa resolutividade de casos o correto seria revisar a LEI DE EXECUÇÕES PENAIS, que condenou o caseiro que matou a menina usando um jet ski a ficar solto. Isso mesmo. O cara que estava embriagado e matou uma menina, foi condenado a “REGIME ABERTO”. Alguém acha que um ladrãozinho de galinhas vai ficar preso só porque a PM o surpreendeu roubando?
Quanto ao atendimento ao patrulheiro, pergunto aos coronéis: qual policial é bem atendido internamente, nas sessões administrativas da PM? Na SJD, No P1,P2, P3, P4, P5? Quantos elogios individuais prescrevem por não terem sido lançados nos assentamentos individuais do policial? Quantas planilhas individuais estão atualizadas? Quantas medalhas de valor militar sequer foram pedidas? Quantas láureas prescreveram por não terem sido requeridas no prazo? Quantas unidades dispõem de um serviço de excelência? Estamos na mesma situação.


Quanto à capacidade investigativa, e essa é a pior argumentação possível para se utilizar, uma vez que na PM não existe o instituto da ampla defesa e do contraditório.
A constituição federal, artigo 5º diz que: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
A lei Federal 8906/94 diz que: Art. 2º O advogado é indispensável à administração da justiça.
Entretanto, nas investigações da PM esses direitos e deveres não existem. Não se pode administrar a justiça unilateralmente, como é feito nos quartéis e no próprio tribunal da PM. A sociedade não precisa de um novo AI-5.
AS INVESTIGAÇÕES NA PM SÃO PRODUZIDAS E RELATADAS POR QUEM NÃO TEM FORMAÇÃO JURÍDICA, NEM EXPERIÊNCIA INVESTIGATIVA, NEM CAPACIDADE ÉTICA E NEM DESVINCULAÇÃO FUNCIONAL COM OS INVESTIGADOS. SÃO CORPORATIVAS E DIRECIONADAS.
Se não servem para o público interno, como poderiam funcionar para o povo?
Nos colocamos à disposição para discutirmos esse assunto com qualquer coronel, onde e quando ele quiser, bem como a desmilitarização e criação de um setor de fiscalização externo das contas da PM.

Marco Ferreira - Jornalista